“Uma
pesquisa realizada pela Fundação Institucional de Pesquisas Econômicas (Fipe),
em 2009, mostrou que o preconceito étnico-racial é o segundo mais forte nas
escolas brasileiras, atrás apenas de preconceito por questões físicas, como
obesidade.”
E
ai eu vim ao mundo negra, e ainda na infancia, comecei a ter com problemas com o peso.
Sempre
houve um motivo para piadas: era o “cabelo pichaim”, ou era a “bunda de
tanajura”. O que eu compreendia quando
bem pequena é que isso nao era um elogio. Havia algo de errado comigo. E nao
havia nada que eu pudesse fazer a respeito – não dá pra mudar o formato do seu
corpo. Adultos não sabem o que
causam numa criança quando fazem esse tipo de comentário. Deviam saber.
O racismo se encarregou de tornar todas as nossas características africanas indesejadas, odiadas: Nosso corpo - nariz, labios, o formato do nosso corpo, nosso cabelo, nossas formas, tudo é tido como errado, inadequado. Somos ensinadas a nao querer ser nós mesmas.
O racismo se encarregou de tornar todas as nossas características africanas indesejadas, odiadas: Nosso corpo - nariz, labios, o formato do nosso corpo, nosso cabelo, nossas formas, tudo é tido como errado, inadequado. Somos ensinadas a nao querer ser nós mesmas.
Então
o sentimento de inadequação sempre me acompanhou. Eu me sentia como a criança que destoava
do padrão – Enquanto as outras meninas eram mais magras, tinham pernas mais
finas, tinham o cabelo”melhor”, ali estava eu: cabelo bem crespo e curto, coxas
e bunda maior do que todo mundo.
Minha
infancia foi marcada por tentativas de mudar o cabelo: passa pasta, passa henê, ferro quente. E
queima a testa, e arde o couro, e muitas vezes CAI. Com 9 anos tive meu
primeiro corte quimico – meu cabelo ia se dissolvendo na pia da cabeleireira,
enquanto sofria os efeitos do alisante Wellin, forte demais para o cabelo de uma
criança. O cheiro da soda cáustica nunca saiu da minha mente.
Lá pelos 10, 11 anos, além do "cabelo pixaim", engordei. Então alem de mudar o cabelo, também
tinha que mudar o corpo, porque eu era “fora do padrão” magro, esguio
...eurocêntrico. As primeiras dietas começaram na adolescência. Com 17 anos
comecei a tomar remedios pra emagrecer . Emagrecia e voltava a engordar. E
começava um ciclo de uso de anfetaminas que resolviam temporariamente a questao
do corpo, mas nao definitivamente. Claro que eu nao tinha essa consciencia,
entao só sabia que o mundo era de um jeito e eu era de outro, e eu tinha que
tentar me enquadrar, nao importa como. E não conseguia. E sofria.
O
sentimento de inadequação seguiu na vida adulta. E dietas, e permanentes, e
alisamentos, e sucessivas tentativas de atingir um padrao que alguem criou. E
por muito tempo esse sentimento de ser inadequada permeou minha relação com o mundo,
amigos, amores...
Mas
com a vida adulta veio a conscientização, o autoreconhecimento. Sou bonita SIM!
Sou bacana, sou interessante, tenho valor. E a autoestima começa a se
construir. Com vinte e poucos anos,nascia o desejo de usar meu cabelo como ele é, mas faltava
informacao. E me achava muito gorda pra usar cabelo black. De novo, pensava que havia um padrão e que eu nao estava nele.
E
o tempo passa. E a vida me apresenta pessoas incriveis que me ensinaram a
gostar de mim como eu sou. OBA, Sou negra e sou linda. Agora só precisava
emagrecer uns 25kg , esperar o cabelo crescer e ficar igual o da atriz fulana de tal, e tornar esguia pra
ficar completa. ... #fail
Ao
longo do tempo meu corpo foi mudando, emagreci. Mas nao importava o quanto – continuava grande
para os padrões. Que diabos, será que meu destino é esse?! Pensava eu. Olhando para trás, e com a consciencia que tenho hoje, vejo que em muitos momentos eu tinha um corpo absolutamente normal. Mas me sentia diferente.
Vivemos
num sistema cujo objetivo é fazer com que a gente se sinta inadequada e
insatisfeita. E o fazem com perfeição. E
por um longo periodo da minha vida, sempre encontrei um motivo para NAO GOSTAR PLENAMENTE DE MIM
MESMA.
Mas
o tempo continuou passando. 4 anos atras tomei a decisão de usar meu cabelo de
forma natural. Nunca mais usei quimica. Depois de 13 meses de transição no qual
usei um megahair (coisa que nunca gostei, só usei em casos de urgencia) ,
adotei meu crespo natural e desde entao vivo feliz com ele.
Olhar-me
no espelho e me ver como originalmente sou, e gostar disso. É uma revolução. É
uma ruptura com padroes estabelecidos. É uma jornada para dentro de mim. É
lindo, e nao tem volta. Meu cabelo é lindo, ele precisa de cuidados como
qualquer outro. Posso um dia usar quimica novamente SE QUISER. Mas nao tenho
nenhuma vontade.
E
ao me reconhecer, passei a entender também o meu corpo. Minhas
formas são as mesmas das minhas ancestrais africanas. Entender que esse é meu
BIOTIPO, e não um problema, fez com que eu parasse de buscar um padrao que nao
me pertence. Hoje me cuido para eliminar o peso excedente que põe em risco a minha saúde.
Dedico a mim o cuidado que meu corpo merece e precisa. Mas faço isso por AMOR,
e não mais por REJEIÇÃO A MIM MESMA.
Aprender
a me aceitar tal como eu sou, é um presente que me proporcionei.
Ainda
vejo muitas mulheres – e ultimamente também homens – sofrendo por nao se
acharem adequados. Que passam o tempo catando “ defeitos” em seu corpo, e
gastando tempo precioso da vida tentando se enquadrar. Como eu mesma, no
passado.
Só
posso dizer: OLHEM para si mesmos. Busquem se reconhecer. Cada um de nós é
ÚNICO e deve celebrar essa diversidade, e ama-la. É insano criar um padrao para que bilhoes de
pessoas se enquadrem. E tentar se enquadrar, é consumir um tempo precioso da
vida – que deve ser usado para desfrutá-la, e não para sofrer!
Hoje
sou crespa, sou grande e me amo assim. Sou feliz. E busco todos os dias a minha
melhor versão. Essa é a minha grande transformação.
E
que cada pessoa possa alcançar a sua plena identificação com a sua imagem –
corpo, cabelo, biotipo - e seja feliz
que é o que todos merecemos.
Lindas palavras <3 Com certeza somos lindas do jeito que somos. Não podemos ligar para opiniões alheias :)
ResponderExcluirderepentelivros.wordpress.com
Obrigado Isabella Alves! Que todas nos possamos nos gostar do jeito que somos e nao ficar sofrendo pra caber no padrao de ninguem. Beijos!
ExcluirQue texto maravilhoso! Vc é linda!
ResponderExcluirBeijo
www.leticiatomsik.com
Obrigado Leticia. É a minha historia, e a historia de muitas de nós. Beijos!
ExcluirPerfeito, viado! Perfeito!
ResponderExcluirObrigado Bee!! Te amo
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